Ensino de ‘necessidade, eficiência e equidade em saúde’: a percepção de especializandos sobre o significado destes conteúdos

Autores

  • Felipe Galvão Machado Universidade de São Paulo - USP
  • Leonardo Carnut Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)

DOI:

https://doi.org/10.14295/jmphc.v11iSup.777

Resumo

O ensino dos conceitos de ‘necessidade em saúde’, ‘eficiência’ e ‘equidade em saúde’ é um desafio para os que se dedicam à docência dos conteúdos das ciências econômicas no âmbito das formações na área da saúde. Não raro, a polissemia dos termos e suas ancoragens epistemológicas, assim como a variabilidade descrita por diversos autores na literatura científica, dificultam a clareza analítica necessária sobre estes conceitos. Nesse sentido, é comum os estudantes que se dedicam a estudar a área da economia da saúde terem uma visão parcelar (eminentemente neoclássica) destes conceitos devido a hegemonia deste enfoque do pensamento econômico na saúde nos últimos anos. Quando essa visão hegemônica não coloniza o pensamento econômico a ser ministrado em sala de aula, o que acontece com frequência é emergência sobre a dúvida em qual conceito repousar a análise decorrente da vasta diversidade e imprecisão que os termos detêm devido ao amplo dissenso sobre eles. Em termos genéricos, pode-se dizer as necessidades em saúde é conceito multidimensional que depende do sistema institucional-administrativo e sua orientação a satisfazê-las na população. Em adição, destaca-se a importância de se repensar a organização do processo de trabalho, gestão, planejamento e construção de novos saberes e práticas em saúde, com o objetivo tornar a atenção mais humanizada traduzindo as necessidades de saúde do usuário em uma oferta de serviço, de acesso à tecnologia e de asseguramento de uma vida salubre. No que se refere ao conceito de eficiência, o seu uso desvinculado de um qualificador que lhe dê sentido, torna o debate na área totalmente estéril. Quando se trata da aplicação do conceito de eficiência, especialmente em sistemas de saúde universal como é o caso do Sistema Único de Saúde (SUS), faz-se primordial a conjunção entre, no mínimo, três tipos de eficiência: econômica, administrativa e jurídica. Esta articulação se refere aos elementos centrais que garantam a eficiência em seu amplo aspecto conduzindo a um sistema de saúde que assegure as necessidades de forma devidamente ajustada à demanda. No que se refere ao conceito de equidade em saúde, o problema se repete. Equidade em saúde em seu sentido original, em termos marxianos, significa “de cada um segundo suas capacidades, a cada um segundo suas necessidades”, entretanto com o avanço da teoria da justiça de John Rawls (‘justiça como equidade’) a perspectiva liberal de equidade foi sendo cunhada tornando o conceito próximo à ideia de ‘focalização’. Isto alcançou seu auge quando o Banco Mundial em 2006 editou as recomendações para os sistemas de saúde latino-americanos promovendo absorção desta significação do conceito de equidade de forma pouco crítica pela corrente neodesenvolvimentista que, em termos gerais domina o pensamento econômico na saúde coletiva atualmente. É neste cenário em que a clareza sobre estes conceitos torna o ensino da economia da saúde um desafio a ser compreendido e estudado para que o debate sobre esses conceitos se qualifique e ganhe a precisão necessária ao estatuto de cientificidade requerido para o tema. Objetivo: Analisar a percepção dos discentes da especialização em Economia e Gestão em Saúde sobre os conteúdos aprendidos considerado como mais importantes sobre necessidade, eficiência e equidade em saúde. Método: Foi uma abordagem qualitativa para investigação de percepção discente sobre os conteúdos mais importantes da disciplina ‘Necessidade, Eficiência e Equidade em Saúde’. Esta disciplina foi ministrada no terceiro módulo da especialização em Economia e Gestão em Saúde da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo e teve 20 horas-aula das quais todas foram teóricas. A metodologia de ensino consistiu no uso da Sala de Aula Invertida como uma mescla entre tempestade de ideias, discussões de textos, aula expositiva-dialogada e mapas conceituais. Ao final do componente, foi realizada uma entrevista não-estruturada, ao final de cada uma das 8 aulas. Perguntou-se: quais as partes (conteúdos aprendidos) dessa aula te chamaram mais atenção ou você achou mais importante? Os estudantes respondiam livremente à questão. Analisou-se o material produzido através de análise de conteúdo, por meio da análise textual produzida pelo software IRAMUTEQ. Esta análise é aplicada nos estudos de pensamentos, crenças e opiniões produzidas em relação a determinado fenômeno, tema de investigação, permitindo a quantificação de variáveis essencialmente qualitativas originadas de textos, a fim de descrever o material produzido por determinados sujeitos. Ao final da análise foi possível identificar a percepção dos discentes da especialização sobre o conteúdo estudado. Resultados: Obteve-se 8 variáveis. Cada texto produzido ao final de cada aula foi considerado uma variável de texto. Totalizou-se 80 segmentos de texto com 934 formas textuais. Obteve-se 615 palavras únicas (65,58% do total das formas). As principais palavras mais frequentes sobre o mais importante das aulas foram: aula sobre “Economia, Política e Saúde: os termos do debate na conjuntura brasileira e o SUS” (Aula 1): ‘político’ (1,43); aula sobre “Necessidade em Saúde – Fundamentos” (Aula 2): ‘necessidade’ (4,73) e ‘saúde’ (0,66); aula sobre “Necessidade em Saúde - Debate atual (Aula 3): ‘necessidade’ (3,34) e ‘conceito’ (0,24); aula sobre “Eficiência em Saúde – fundamentos” (Aula 4): ‘eficiência’ (7,13) e conceito (1,96); aula sobre “Eficiência em Saúde e a lógica do Desempenho” (Aula 5): ‘eficiência’ (1,69); aula sobre “Eficiência em Saúde - qualificações e equilíbrio entre conceitos” (Aula 6): ‘eficiência’ (1,06); aula sobre “Equidade em Saúde – fundamentos” (Aula 7): ‘equidade’ (5,67) e ‘social’ (1,51) e aula sobre “Equidade em Saúde –  Debate atual” (Aula 8):  ‘equidade’ (4,11). Na análise de similitude foi possível identificar que os estudantes montaram alguns significados: o primeiro é que a “saúde como necessidade é questão técnica essencial”, contudo compreenderam que “é importante entender a decisão e a saúde sobre o alcance das necessidades em saúde”. Sobre a eficiência eles compreenderam que “ajuda nos resultados e nos recursos empregados” e “informa a gestão”. Por fim, sobre a equidade eles compreenderam que “é necessário desconsiderar a focalização para atingir a igualdade”. Considerações Finais: Os discentes reconhecem os termos como importantes, entretanto não discorrem sobre suas conceituações como algo importante. Para eles o debate sobre o alcance das necessidades e a eficiência como princípio da gestão em saúde predominam como mais importante.

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Publicado

12-12-2019

Como Citar

1.
Machado FG, Carnut L. Ensino de ‘necessidade, eficiência e equidade em saúde’: a percepção de especializandos sobre o significado destes conteúdos. J Manag Prim Health Care [Internet]. 12º de dezembro de 2019 [citado 23º de novembro de 2024];11. Disponível em: https://jmphc.com.br/jmphc/article/view/777

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